segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Armadilhas da obesidade - Parte 2

Armadilhas da obesidade - Parte 2
Mecanismos cerebrais que regulam o prazer da alimentação, a fome e a sensação da saciedade são muito semelhantes aos que influem na dependência de drogas como álcool e cocaína.
por Oliver Grimm

Oliver Grimm é psiquiatra do Instituto Central de Saúde Mental de Mannheim, Alemanha
[continuação]

MARKETING AGRESSIVO
O sucesso da indústria de fast-food não deixa dúvidas de que o comportamento alimentar é facilmente influenciável por estímulos externos. Entender o que se passa no cérebro dos gulosos certamente ajudará a desenvolver estratégias terapêuticas mais eficazes para a luta contra a epidemia global de obesidade.

De fato, alguns medicamentos usados na terapia contra o abuso de drogas têm ajudado pacientes obesos a manter a boca fechada por mais tempo. Antagonistas opióides (que neutralizam o efeito da morfina) como naloxone e o naltrexone, oferecem bons resultados. Drogas bloqueadoras dos receptores canabinóides também ajudam a controlar a compulsão alimentar. No entanto, não há pílula mágica e na maioria dos casos a perda de peso é lenta. Estudo de 2005 realizado pelo endocrinologista Luc Van Gaal, do Hospital Universitário da Antuérpia, Bélgica, concluiu que esses medicamentos fizeram os pacientes perder em média 7 kg por ano, ao passo que aqueles que tomaram placebo perderam quase 2 kg no mesmo período. Obviamente, emagrecer apenas com remédio é uma ingênua pretensão. Mudar os hábitos alimentares, de preferência com o acompanhamento de um nutricionista, é a combinação que proporciona melhores resultados. Mas é fácil falar...

Tantos os dependentes químicos quanto os obesos são estigmatizados pela sociedade, em parte por causa da crença muito disseminada de que abusar de comida ou de substâncias psicoativas é algo completamente sujeito ao controle voluntário - o que não é verdade.

Hoje, obesidade e abuso de drogas são considerados distúrbios multifatoriais com forte presença de componentes genéticos. Até 60% da predisposição à dependência química e cerca de 50% dos casos de obesidade podem ser atribuídos a causas hereditárias, apoiadas por fatores subjetivos e ambientais. Vários estudos já identificaram mutações igualmente importantes para a obesidade e a dependência, embora se saiba que a expressão de ambas depende da participação de vários genes.

Mas como não somos apenas produto de nossa carga genética, a interação com o meio é o que dá contorno ao quadro epidemiológico atual. Além da enorme oferta de alimentos de alto conteúdo calórico a preços muito acessíveis, os pesquisadores apontam o stress como um poderoso fator ambiental associado à propensão ao comportamento compulsivo relacionado tanto a drogas quanto à comida. Crianças estressadas, por exemplo, têm maior risco de ficar obesas ou de usar drogas na adolescência ou no início da vida adulta.

Além dos aspectos psíquicos, genéticos e psicossociais, também microorganismos podem influenciar as possibilidades de uma pessoa ser gorda ou magra. Segundo pesquisas recentes, a flora intestinal dos obesos tem maior proporção de microorganismos que ajudam na digestão dos alimentos. Estudos com camundongos sugerem que a obesidade poderia ser contagiosa. Quando certas bactérias foram transplantadas de animais gordos para outros magros, em pouco tempo os últimos aumentaram a quantidade de gordura corporal.

- Tradução de Saulo Krieger

Doce sedução
Nem todas as drogas causam dependência com a mesma rapidez ou na mesma intensidade. Um dos fatores que fazem a diferença é a forma como a substância é administrada. Quando são injetadas ou inaladas em geral se tornam mais poderosas que quandos aspiradas ou ingeridas e isso ocorre porque as primeiras atingem o cérebro em concentrações mais altas. Ainda assim, as substâncias psicoativas têm características intrínsecas que as distinguem quanto a sua capacidade de produzir dependência. O experimento clássico, em que ratos pressionam barras para obter uma dose de alguma droga por via intravenosa, não deixa dúvidas. Quando lhes é oferecida cocaína ou anfetamina, eles se auto-administram com tal freqüência que deixam de comer e morrem por falta de alimento. O mesmo não ocorre com a nicotina ou a maconha, por exemplo. A diferença está no poder adictivo de cada uma, que reflete a atividade do núcleo accumbens no momento da administração. Quanto mais dopamina é liberada nessa região, mais intenso será o prazer do indivíduo e maior a probabilidade de que ele busque a sensação repetidas vezes.

Com comida não é diferente. Alimentos ricos em gordura e carboidratos estão muito mais relacionados a comportamentos compulsivos que os com alto teor de proteínas e fibras. Quem nunca devorou uma caixa de bombons num só dia ou um pacote de batatas-fritas em poucos minutos? Já encontrar quem coma mais de três bifes ou todo um pé de alface numa mesma refeição é bem mais difícil. Aí está o problema das dietas para redução de peso. Como frutas, vegetais e alimentos ricos em proteínas (e pobres em carboidratos) não têm o mesmo poder de ativar nossos mecanismos de recompensa, resistir às tentações do dia-a-dia, para muitos é uma tarefa dificílima, e viver de alimentos que lhes proporcionam muito menos prazer é quase uma tortura.

Estômago reduzido, novos sintomas
A cirurgia de redução de estômago é uma opção cada vez mais adotada por quem não suporta mais viver com excesso de peso. O procedimento se popularizou de tal forma que muitos já questionam sua banalização e seus reais benefícios em longo prazo. Afinal, de que adianta modificar radical e irreversivelmente uma parte do corpo se a origem do problema está no cérebro? De fato, vários estudos mostram que a maioria dos pacientes não só volta a engordar como desenvolve novos distúrbios.

Estudo feito no Hospital das Clínicas (HC) da Universidade de São Paulo que acompanhou 53 pacientes que passaram pelo procedimento entre cinco e nove anos atrás revela que 64% voltou a ser obeso e 13% retornou ao estado de obesidade mórbida. Segundo a psicóloga Marlene Monteiro da Silva, coordenadora do curso de transtornos alimentares e obesidade do HC, o esperado é que o paciente emagreça o almejado e, depois, ganhe novamente cerca de dez quilos. No entanto, na amostra avaliada, quase 60% engordou mais de dez quilos, 13% ganhou mais de 30 quilos e apenas 8% manteve o peso ideal. "Os dados são preliminares, mas não deixam de ser um alerta para pacientes e médicos: a cirurgia de redução de estômago não deve ser entendida como uma fórmula mágica", explica Monteiro da Silva. Os resultados revelam ainda que não é raro os pacientes trocarem um compulsão por outra. Casos de alcoolismo foram observados em 18% dos indivíduos. "A obesidade é um sintoma de problemas anteriores. Existe no obeso a necessidade de se esconder de alguma coisa que vai ser descoberta somente após a cirurgia", conta a psicóloga.

Reduzir o tamanho do estômago parece uma medida simples, mas são tantos os fenômenos psíquicos envolvidos que o acompanhamento psicológico não deve ser negligenciado. Segundo Monteiro da Silva, o período pós-operatório pode ser comparado às fases do desenvolvimento infantil. Os primeiros três meses equivalem à fase oral: a maior preocupação do indivíduo é com a comida, que consiste apenas de sopas e papinhas. Nesse momento ele fica emocionalmente frágil e chora muito. A partir do quarto mês há um "retorno" à fase anal: alguns chegam a pesar 20 quilos a menos e sentem-se mais expostos. Surge uma agressividade, o medo da mudança de identidade e a impossibilidade de recorrer à comida para aliviar as angústias. Por volta do sétimo mês começa a fase pré-genital, uma espécie de adolescência emocional. Muitos quilos mais magros, os pacientes querem aproveitar tudo, muitas vezes de forma inconseqüente. É nesse momento que correm o risco de se tornar dependentes de álcool e outras drogas ou de viver relações promíscuas. As compulsões tendem a aumentar depois da cirurgia e costumam ser acompanhadas de depressão e de ganho de peso, apesar do estômago reduzido. "Aí as pessoas se dão conta que o problema não era só o excesso de peso, de que há sempre faltas e que é preciso conviver com elas", diz a psicóloga.

Para conhecer mais
Obesidade: prevenindo e controlando a epidemia global. Organização Mundial de Saúde. Roca, 2004.
Transtornos alimentares e obesidade. Maria Angélica Antunes et al. Artmed, 2006.
Obesidade como sintoma. Maria Salete Arenales Loli. Vetor, 2000.
Associação para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica - www.abeso.org.br
Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo - www.endocrino.org.br

Fonte:
http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/armadilhas_da_obesidade_5.html

2 comentários:

  1. Nossa, esse é um assunto bem polêmico, não?

    Muitas pessoas acham que a obesidade é uma questão somente de compulsão e o que não é verdade. Tem a disfunção química do corpo, do metabolismo lento entre outros fatores. Claro que a ingestão de comidas estilo fast food são bombas, mas e aquelas pessoas, como eu, que não comem esse tipo de comida com frequência?

    Fui descobrir a pouco tempo que tenho problema na tireoide e ainda não me acertei com o remédio, esse é um dos fatores que atrapalham mto o emagrecimento.

    Já vi casos de pessoas que fizeram inúmeros tratamentos, inclusive os mais invasivos ( cirúrgicos) e que não deram mto certo. Acho que cada caso deve ser investigado para que possa ser tratado adequadamente.

    Ah, te chamei pra um desafio... passa lá no meu blog para conferir depois, ok?

    Bjks ")

    http://lumanzana.blogspot.com/

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    Respostas
    1. Menina, estou passando pelo mesmo!!! faz quase 1 ano que iniciei o tratamento para hipotireoidismo, mas até agora não perdi peso não, tb bem que faço exercício esporadicamente, mas bate aquela ansiedade, mas assim como vc eu não tenha uma alimentação de fast food, mas, metabolismo é metabolismo e o meu está lento!
      Geralmente, cirurgia bariátrica reque um pós operatório para toda a vida..e geralmente as pessoas ficam depressivas, psicóticas e voltam a engordar...
      triste, mas é real...
      Passarei sim! Obrigada pela visita!
      Beijos, Beijos

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